Será que tudo são números mesmo?!

O dia em que eu acordei e tinha um e-mail solicitando uma proposta inusitada (diante do conservadorismo corporativo, que ama números e gráficos.

Dá para fazer diferente no mundo corporativo, quebrando velhos paradigmas?

Vivi isso na pele na pandemia, quando alguns líderes me chamaram para ajuda-los a enxergar “o algo a mais”.

Essa empresa estava enfrentando alguns desafios e eles perceberam que por mais que ações assistencialistas estivessem sendo feitas, situações precisavam ser clareadas, precisava ser dada visibilidade a algo que ainda estava oculto e indizível.

Quando iniciei o trabalho, a equipe de saúde ocupacional já tinha o conhecimento de alguns sintomas, já aparecendo em forma de afastamentos, aumento da utilização do serviço de saúde emocional, mas esses dados ainda estavam muito nebulosos e eu cheguei para ajudar a contar essa história através de dados qualitativos.

Comecei então um trabalho profundo e corajoso de reconhecimento do contexto organizacional e entendimento da relação de cada pessoas com o seu trabalho e somente assim, seria possível levantar hipóteses sobre os indutores desses problemas.

Iniciei com eles a construção de um novo conceito sobre a relação entre saúde mental e trabalho e para isso, muitos conceitos tiveram que ser desconstruídos. Provoquei a empresa a sair do “lugar comum”, que tratava a saúde mental sob uma perspectiva individual, para que começassem a olhar pelo aspecto coletivo.

Confesso que não foi fácil, pois é impressionante como esse assunto é tratado de forma superficial e assistencialista.

Parti então para o trabalho de campo e me propus a conversar com todas as pessoas e então os problemas e sofrimentos começaram a emergir.

Vi que questões desse “novo normal” começaram a afetar a psiquê das pessoas. O trabalhar em home office se tornou invisível, o dia a dia não era visto, o distanciamento dos líderes se tornou patológico e as pessoas não tinham mais o olhar do outro para validar o trabalho.

Para muitos trabalhadores houve o enfraquecimento da identidade, pois sabe-se que o fortalecimento da identidade se dá pelo olhar do outro, pelo sentimento de pertencimento, pelos elos sociais.

E além de tudo, ainda havia a impossibilidade do contato olho a olho com gestores e pares, da conversa na hora do almoço e do cafezinho, da resolução de problemas em conjunto, de forma colaborativa.

A consequência disto é que quando não há lugar para se falar das dificuldades e do sofrimento, o trabalho perde o sentido e o adoecimento surge.

Por fim, após esse profundo diagnóstico dinâmico, percebemos que os fatores adoecedores estavam localizados na organização do trabalho, no contexto de trabalho e isso estava colocando em risco não somente a saúde das pessoas, mas também o negócio como um todo.

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